55 cm x 60 cm
Musée d'Orsay
Abro os olhos e não sei onde estou. Ao longe, vejo formas desfocadas que se estendem no horizonte, vejo cores distorcidas entrelaçadas com o vento que se faz sentir. Levanto-me e ando… aos meus pés sinto uma superfície rugosa, a qual conheço perfeitamente, estou numa praia, a praia que tantas memórias me evoca, a mesma praia que me viu crescer. Uma brisa suave passa por mim e sei com certeza que é de manhã, sinto a energia do vento, ouço ao longe o mar, ele está pouco agitado hoje, mas não o vejo com nitidez e por isso aproximo-me do que me parece ser o azul. O sol aquece-me a alma e o cheiro a maresia me atraí, aproximo-me daquele azul forte, que é tão belo. A brisa é cada vez mais forte e os meus pés sentem uma areia um pouco molhada. Sei que estou perto do mar, ouço o seu movimento, o seu dançar e enrolar, sinto as suas carícias nos meus pés. A água está um pouco gélida a esta hora, mas não importa. Olho para todos os lados e não consigo detectar a presença de ninguém, ouço algumas gaivotas e pouco mais. A minha visão ainda não se alterou, vejo tudo turvo e mesmo assim consigo apreciar toda a beleza que me rodeia. Fecho os olhos e sento-me, e sinto em todo o meu corpo a vida deste lugar, como se eu não fosse mais do que uma brisa ondulante, uma parte integrante, como se eu fosse a praia. Algo permanece no ar, uma música distante, uma melodia triste em crescente, até que a melodia se revela com marteladas intensas, como se uma raiva se tivesse apoderado da própria música. Tudo se torna ensurdecedor, tento ouvir a melodia da praia, a brisa, as gaivotas, a areia a saltitar, mas não consigo…é como se algo me puxasse para a escuridão… A escuridão é fria, triste, soturna, congela-me todos os membros do corpo e o coração parece que já não bate, tudo fica inanimado. Custa-me pensar, as minhas memórias desaparecem pouco a pouco e nada resta, já não sei quem sou, já não sou eu e sinto uma dor como se a vida acabasse, como se a energia se dissipasse de todas as células do meu corpo… perco a noção de mim e de tudo, desapareci e quem sabe se algum dia voltarei a existir.
1 comment:
O nosso refúgio, o que nos vê nascer, o que nos alimenta os sonhos, dá alento à nossa vontade e sorri quando nos vê crescer. Algo que nos liga a este mundo de dor e que atenua os seus efeitos, mas nunca nos diz que a escuridão não existe, nunca nos mente, pois sabe que a também traz no ventre! Por isso está sempre de braços abertos quando regressamos de cabeça baixa e com a espada a desenhar linhas estafadas pelo chão. Por que me recebes? Porque me acalmas a alma e me retemperas as forças? Sabes que te vou deixar novamente, regressar para a luta até adormecer de exaustão novamente em ti... Conseguir-me-ia levantar sem ti? Talvez nunca tão rápido... Mas porque sorris ao ver-me partir, a mergulhar novamente na dura escuridão? Sabes que eu pertenço lá, que é essa a minha missão... Mas então por que me canso e necessito tanto do teu regaço? Talvez o meu sangue não seja totalmente negro, e traga comigo um pouco da tua essência, da tua pureza... Debaixo desta armadura negra, coberta de carambelo, és tu quem não me faz sorrir quando sinto frio! Mas no fundo sou fraco, sempre precisarei de ti. Então onde pertenço? A ti ou no meio da belicosa multidão? Porque não paro de lutar, e porque não quero descansar indefinidamente em ti? Parece um ciclo interminável... Haverá alguma vez um novo início, ou apenas mais um fim?
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